PF identifica caso em que homem que roubou civic de tenente foi executado depois de ordem para deixar carro com mãos na cabeça.
Publicação:03-03-2011 ás 08h37min
As gravações telefônicas que fundamentaram o inquérito da Polícia Federal (PF) apontam que a maioria das mortes em confronto com membros da Rondas Ostensivas Táticas Metropolitana (Rotam) são na verdade simulações. Um dos casos identificados refere-se à morte de Murilo Alves de Macedo, de 26 anos, que estaria com um carro que havia roubado na véspera de um tenente da Polícia Militar (PM).
O Honda Civic em questão foi avistado na noite de 27 de agosto do ano passado na saída para Trindade pelo subtenente Fritz Agapito Figueiredo, também preso na Operação Sexto Mandamento. Membro da Rotam, o militar estava de folga no dia do crime. Mesmo assim, ligou para o Comando de Operações da PM (Copom) e pediu a confirmação de que se tratava do carro roubado. Pediu reforço, mas avisou que iria abordar.
As escutas registraram toda a abordagem. De acordo com o documento, ouve-se com nitidez a voz de Fritz ordenando que os dois ocupantes do Honda Civic ponham a mão na cabeça, o que significa que eles saíram do carro e se renderam. Em seguida, o barulho de um tiro. Minutos depois, Fritz fala com uma equipe da Rotam e pede o reforço.
Durante toda a ação, Fritz mantém contato com os cabos Cláudio Henrique Camargos e Ricardo Machado Rodrigues, também presos pela PF. Ao Copom, mente que não havia capturado os suspeitos de roubo. "O cara deu o pinote na BR", justificou. Mas em ligação telefônica com Camargos, calmamente avisa ao subordinado para ligar o giroflex e seguir rumo a um matagal, na entrada da Chácara Caveira, no Jardim Real, onde a vítima foi morta.
A versão oficial deu conta de que Murilo tentou fugir e que atirou contra os policiais. Afirma ainda que houve confronto, o que é desmentido pelas gravações telefônicas. O companheiro da vítima foi dado como desaparecido. Depois do homicídio, o documento sustenta que os cabos Cláudio Henrique Camargos e Ricardo Machado Rodrigues, e o tenente Vitor Jorge Fernandes, também preso na operação, prestaram falsas declarações na Delegacia de Homicídios da capital.
Outro flagrante de simulação de confronto também diz respeito à atuação do subtenente Fritz Agapito Figueiredo, menos de um mês depois. Na noite de 21 de setembro, uma ocorrência resultou na morte de dois irmãos, supostos ladrões de carros: Antônio Milton Rodrigues Magalhães e Edilson Rodrigues Magalhães.
Os irmãos eram apontados como autores do roubo de uma caminhonete Hilux e de um Toyota Corolla. A dupla foi morta supostamente em uma troca de tiros com a Rotam. Após os assassinatos, as gravações registram Fritz afirmando que iria até Goianápolis encontrar o proprietário de uma caminhonete que ele havia recuperado. Normalmente, o procedimento é avisar o dono do objeto roubado e solicitar que ele busque no pátio de uma delegacia ou quartel da PM.
No entanto, a PF recebeu denúncia de que a caminhonete roubada havia ficado estacionada na noite anterior no Posto Anhanguera, na capital. Após verificação, os policiais federais souberam se tratar de estabelecimento pertencente à tia de Fritz Agapito, na Vila Redenção, na BR-153.
Procurada pela polícia, a dona do posto de combustível demorou dois dias para dizer aos investigadores que as imagens do circuito interno de TV não estavam disponíveis. Ela alegou que os computadores que registraram as imagens das câmeras de segurança haviam sido atacados por vírus. A PF trabalha com a hipótese de troca do disco rígido da máquina, pois os peritos seriam capazes de recuperar os arquivos mesmo que eles tivessem sido apagados propositalmente. Para a PF, os irmãos foram mortos ainda na noite de 21 de setembro, enquanto a Hilux estava estacionada no posto de combustíveis.
Ajoelhados, foragidos são executados
O tenente-coronel Ricardo Rocha é o ponto de partida das investigações. A escolha se deu pelo fato de o então major haver protagonizado o que o Ministério Público (MP) considerou, à época, um dos atos mais mórbidos da Polícia Militar em Goiás nos últimos anos. Em 10 de outubro de 2003, Rocha comandou a chacina de cinco re-educandos à beira do Córrego do Sapo, em Rio Verde, segundo o inquérito. As vítimas haviam fugido da cadeia e, capturadas pela PM, foram levadas para as margens.
Ali, conforme os autos, Rocha ordenou que apenas os policiais do Grupo de Patrulhamento Tático, espécie de Rondas Ostensivas Táticas Metropolitan (Rotam) que atua no interior (GPT) permanecessem. Os re-educandos morreram com tiros na cabeça e na nuca. Eles estavam rendidos, desarmados e provavelmente ajoelhados quando foram atingidos. O caso ainda não foi julgado.
Depois disso, Rocha foi transferido para Goiânia, onde comandou a Rotam de 2003 a 2005, período em que a PM mais matou no Estado, segundo o MP. De Goiânia, Rocha seguiu para Formosa, onde comandou o 16º Batalhão da PM, também no período em que mais execuções de supostos criminosos foram registradas na região.
No segundo semestre do ano passado, Rocha foi candidato a deputado estadual, período em que as investigações da PF puderam coletar grande parte das escutas que evidenciam as relações de Rocha e PMs ligados a ele (assessores e apoiadores de sua campanha) com políticos (os então secretários Jorcelino Braga e Ernesto Roller, da Fazenda e Segurança Pública, respectivamente), empresários e principalmente fazendeiros. Numa transcrição de uma ligação interceptada no dia 18 de agosto de 2010, policiais militares apoiadores da campanha de Rocha à Assembleia Legislativa combinam como "dar o choque" (pedir doações) a empresários e órgãos públicos de Formosa. Um dos interceptados é o capitão Durvalino Câmara Santos Júnior, um dos 19 presos na Operação Sexto Mandamento. Ele fala de Goiânia.
"O choque aí (em Formosa) tem de ser de três, cinco, zero, beleza?" Ele pedia R$ 350 mil para a campanha de Rocha, teria dito Câmara a outro PM, também apoiador da campanha de Rocha, que fala de Formosa. "Que sai. Eu já andei sondando aqui o povo do gabinete do Ernesto (Roller) e sai", completou Câmara, ao que interlocutor responde: "Mas tem de ser, né, bicho. Que só aqui é cem cabo eleitoral, né cara?".
Mais à frente, Câmara se diz descontente com o valor, porque soube, por meio do gabinete de Ernesto Roller, que, de Formosa (cidade do secretário) normalmente saem R$ 500 mil. "Nós tem que estruturar bem aqui, por conta de que vai faltar em Rio Verde, né véi?
Certeza", disse o interlocutor de Formosa. Em 23 de agosto do ano passado, Câmara e o major André Ribeiro Nunes (também preso pela PF) conversam sobre como teria sido um acerto entre Ricardo Rocha e autoridades, para conseguir doação para a campanha (os nomes das autoridades não são publicados porque não estão sendo processadas criminalmente).
Policiais são chamados de "loucos"
Policiais loucos, drogados e assassinos. Assim é a definição das Rondas Ostensivas Táticas Metropolitana (Rotam) pelo tenente-coronel Ricardo Rocha, preso na operação Sexto Mandamento. Em um telefonema gravado pela Polícia Federal (PF), o oficial afirma que os militares da Rotam trabalham sob efeito de remédios ingeridos para deixar "acelerado".
"O pessoal da Rotam, deixa eu relembrar o senhor; a Rotam são os assassinos da PM, os da farda preta", disse Ricardo Rocha a um interlocutor não identificado. Para o militar, uma das razões do comportamento dos policiais é o fato deles trabalharem dopados. Ricardo Rocha afirma que os colegas ficam tão condicionados que não conseguem dormir sem os medicamentos. "Quando ele toma, quando ele vai dormir, começa tão forte que ele desmaia, onde ele tá ele corta", disse.
"Prazer"
As transcrições mostram, ainda, que o comportamento violento é encarado, em alguns casos, com naturalidade pelos militares. Uma conversa com um sargento, o cabo Ederson Trindade fala que gosta de matar. "Eu mato por prazer e por satisfação. Um pouquinho de sangue na farda, né chefe, sem novidade, comandante."
Texto: O Popular
Publicação:03-03-2011 ás 08h37min
As gravações telefônicas que fundamentaram o inquérito da Polícia Federal (PF) apontam que a maioria das mortes em confronto com membros da Rondas Ostensivas Táticas Metropolitana (Rotam) são na verdade simulações. Um dos casos identificados refere-se à morte de Murilo Alves de Macedo, de 26 anos, que estaria com um carro que havia roubado na véspera de um tenente da Polícia Militar (PM).
O Honda Civic em questão foi avistado na noite de 27 de agosto do ano passado na saída para Trindade pelo subtenente Fritz Agapito Figueiredo, também preso na Operação Sexto Mandamento. Membro da Rotam, o militar estava de folga no dia do crime. Mesmo assim, ligou para o Comando de Operações da PM (Copom) e pediu a confirmação de que se tratava do carro roubado. Pediu reforço, mas avisou que iria abordar.
As escutas registraram toda a abordagem. De acordo com o documento, ouve-se com nitidez a voz de Fritz ordenando que os dois ocupantes do Honda Civic ponham a mão na cabeça, o que significa que eles saíram do carro e se renderam. Em seguida, o barulho de um tiro. Minutos depois, Fritz fala com uma equipe da Rotam e pede o reforço.
Durante toda a ação, Fritz mantém contato com os cabos Cláudio Henrique Camargos e Ricardo Machado Rodrigues, também presos pela PF. Ao Copom, mente que não havia capturado os suspeitos de roubo. "O cara deu o pinote na BR", justificou. Mas em ligação telefônica com Camargos, calmamente avisa ao subordinado para ligar o giroflex e seguir rumo a um matagal, na entrada da Chácara Caveira, no Jardim Real, onde a vítima foi morta.
A versão oficial deu conta de que Murilo tentou fugir e que atirou contra os policiais. Afirma ainda que houve confronto, o que é desmentido pelas gravações telefônicas. O companheiro da vítima foi dado como desaparecido. Depois do homicídio, o documento sustenta que os cabos Cláudio Henrique Camargos e Ricardo Machado Rodrigues, e o tenente Vitor Jorge Fernandes, também preso na operação, prestaram falsas declarações na Delegacia de Homicídios da capital.
Outro flagrante de simulação de confronto também diz respeito à atuação do subtenente Fritz Agapito Figueiredo, menos de um mês depois. Na noite de 21 de setembro, uma ocorrência resultou na morte de dois irmãos, supostos ladrões de carros: Antônio Milton Rodrigues Magalhães e Edilson Rodrigues Magalhães.
Os irmãos eram apontados como autores do roubo de uma caminhonete Hilux e de um Toyota Corolla. A dupla foi morta supostamente em uma troca de tiros com a Rotam. Após os assassinatos, as gravações registram Fritz afirmando que iria até Goianápolis encontrar o proprietário de uma caminhonete que ele havia recuperado. Normalmente, o procedimento é avisar o dono do objeto roubado e solicitar que ele busque no pátio de uma delegacia ou quartel da PM.
No entanto, a PF recebeu denúncia de que a caminhonete roubada havia ficado estacionada na noite anterior no Posto Anhanguera, na capital. Após verificação, os policiais federais souberam se tratar de estabelecimento pertencente à tia de Fritz Agapito, na Vila Redenção, na BR-153.
Procurada pela polícia, a dona do posto de combustível demorou dois dias para dizer aos investigadores que as imagens do circuito interno de TV não estavam disponíveis. Ela alegou que os computadores que registraram as imagens das câmeras de segurança haviam sido atacados por vírus. A PF trabalha com a hipótese de troca do disco rígido da máquina, pois os peritos seriam capazes de recuperar os arquivos mesmo que eles tivessem sido apagados propositalmente. Para a PF, os irmãos foram mortos ainda na noite de 21 de setembro, enquanto a Hilux estava estacionada no posto de combustíveis.
Ajoelhados, foragidos são executados
O tenente-coronel Ricardo Rocha é o ponto de partida das investigações. A escolha se deu pelo fato de o então major haver protagonizado o que o Ministério Público (MP) considerou, à época, um dos atos mais mórbidos da Polícia Militar em Goiás nos últimos anos. Em 10 de outubro de 2003, Rocha comandou a chacina de cinco re-educandos à beira do Córrego do Sapo, em Rio Verde, segundo o inquérito. As vítimas haviam fugido da cadeia e, capturadas pela PM, foram levadas para as margens.
Ali, conforme os autos, Rocha ordenou que apenas os policiais do Grupo de Patrulhamento Tático, espécie de Rondas Ostensivas Táticas Metropolitan (Rotam) que atua no interior (GPT) permanecessem. Os re-educandos morreram com tiros na cabeça e na nuca. Eles estavam rendidos, desarmados e provavelmente ajoelhados quando foram atingidos. O caso ainda não foi julgado.
Depois disso, Rocha foi transferido para Goiânia, onde comandou a Rotam de 2003 a 2005, período em que a PM mais matou no Estado, segundo o MP. De Goiânia, Rocha seguiu para Formosa, onde comandou o 16º Batalhão da PM, também no período em que mais execuções de supostos criminosos foram registradas na região.
No segundo semestre do ano passado, Rocha foi candidato a deputado estadual, período em que as investigações da PF puderam coletar grande parte das escutas que evidenciam as relações de Rocha e PMs ligados a ele (assessores e apoiadores de sua campanha) com políticos (os então secretários Jorcelino Braga e Ernesto Roller, da Fazenda e Segurança Pública, respectivamente), empresários e principalmente fazendeiros. Numa transcrição de uma ligação interceptada no dia 18 de agosto de 2010, policiais militares apoiadores da campanha de Rocha à Assembleia Legislativa combinam como "dar o choque" (pedir doações) a empresários e órgãos públicos de Formosa. Um dos interceptados é o capitão Durvalino Câmara Santos Júnior, um dos 19 presos na Operação Sexto Mandamento. Ele fala de Goiânia.
"O choque aí (em Formosa) tem de ser de três, cinco, zero, beleza?" Ele pedia R$ 350 mil para a campanha de Rocha, teria dito Câmara a outro PM, também apoiador da campanha de Rocha, que fala de Formosa. "Que sai. Eu já andei sondando aqui o povo do gabinete do Ernesto (Roller) e sai", completou Câmara, ao que interlocutor responde: "Mas tem de ser, né, bicho. Que só aqui é cem cabo eleitoral, né cara?".
Mais à frente, Câmara se diz descontente com o valor, porque soube, por meio do gabinete de Ernesto Roller, que, de Formosa (cidade do secretário) normalmente saem R$ 500 mil. "Nós tem que estruturar bem aqui, por conta de que vai faltar em Rio Verde, né véi?
Certeza", disse o interlocutor de Formosa. Em 23 de agosto do ano passado, Câmara e o major André Ribeiro Nunes (também preso pela PF) conversam sobre como teria sido um acerto entre Ricardo Rocha e autoridades, para conseguir doação para a campanha (os nomes das autoridades não são publicados porque não estão sendo processadas criminalmente).
Policiais são chamados de "loucos"
Policiais loucos, drogados e assassinos. Assim é a definição das Rondas Ostensivas Táticas Metropolitana (Rotam) pelo tenente-coronel Ricardo Rocha, preso na operação Sexto Mandamento. Em um telefonema gravado pela Polícia Federal (PF), o oficial afirma que os militares da Rotam trabalham sob efeito de remédios ingeridos para deixar "acelerado".
"O pessoal da Rotam, deixa eu relembrar o senhor; a Rotam são os assassinos da PM, os da farda preta", disse Ricardo Rocha a um interlocutor não identificado. Para o militar, uma das razões do comportamento dos policiais é o fato deles trabalharem dopados. Ricardo Rocha afirma que os colegas ficam tão condicionados que não conseguem dormir sem os medicamentos. "Quando ele toma, quando ele vai dormir, começa tão forte que ele desmaia, onde ele tá ele corta", disse.
"Prazer"
As transcrições mostram, ainda, que o comportamento violento é encarado, em alguns casos, com naturalidade pelos militares. Uma conversa com um sargento, o cabo Ederson Trindade fala que gosta de matar. "Eu mato por prazer e por satisfação. Um pouquinho de sangue na farda, né chefe, sem novidade, comandante."
Texto: O Popular
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