POLÍTICA: Perícia do Ministério Público inocenta Demóstenes Torres

POLÍTICA: Perícia do Ministério Público inocenta Demóstenes Torres



Pouco mais de dois anos após a cassação do ex-senador Demóstenes Torres, a devassa provocada pelas investigações resultantes da operação Monte Carlo comprova a inocência do político. A informação é do Diário da Manhã (DM).

O DM teve acesso a uma perícia elaborada pelo Ministério Público de Goiás que aponta a compatibilidade da evolução patrimonial de Demóstenes com a sua renda, jogando por terra as acusações de enriquecimento ilícito contra o ex-senador.

No documento repassado ao DM por fontes do MP, assinado pelo perito Glauciney Faleiro da Silva, e datado de 13 de maio de 2014, são apresentados os resultados da análise dos dados da quebra do sigilo bancário de Demóstenes e também informações provenientes do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) entre os anos de 2005 e 2012, dados cartorários, gastos com cartões de crédito e tudo mais que diz respeito à sua vida financeira.

O objetivo era responder a cinco perguntas elaboradas pelo subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Jurídicos do Ministério Público de Goiás, Spiridon Nicofotis Anifantis. Na primeira pergunta, o subprocurador questiona se "há compatibilidade entre a renda declarada pelo investigado (Demóstenes) e a sua evolução patrimonial". A resposta foi taxativa. "Sim. Os dados fiscais evidenciam que a evolução patrimonial do investigado é compatível com seus rendimentos auferidos no período analisado".

A conclusão da perícia confirma que Demóstenes não obteve nenhum ganho fora do salário e lucros de investimentos legais e devidamente informados à Receita Federal. A devassa realizada nas contas de Demóstenes prova definitivamente que o ex-senador não recebeu qualquer quantia de dinheiro que não fosse fruto do próprio trabalho - principal acusação que recaiu sobre o então senador durante o massacre midiático a que foi submetido no período do vazamento ilegal dos grampos da Operação Monte Carlo.

O segundo ponto questionado pelo Ministério Público é sobre as movimentações bancárias de Demóstenes. "Há compatibilidade entre a renda declarada e as movimentações bancárias e demais transações financeiras do investigado?" Novamente, a resposta não deixa margens para dúvidas: "Sim. O montante transacionado pelo investigado em suas contas bancárias no Banco do Brasil ficou, em média, 11% inferior aos seus rendimentos brutos apurados no período de 2005 a 2012".

O terceiro item visa saber se existem bens que não foram declarados por Demóstenes. "Há bens identificados através do dossiê integrado e que não estão declarados no Imposto de Renda do investigado?" A resposta confirma que Demóstenes não sonegou à Receita Federal qualquer bem: "Não. Não foi constatada, pela consulta no dossiê integrado, a existência de bem não declarado pelo investigado à Receita Federal do Brasil".

Na quarta pergunta, o objetivo é identificar depósitos atípicos nas contas de Demóstenes que poderiam estar relacionados a atividades ilícitas. "Houve acréscimo patrimonial atípico na(s) conta(s) do investigado?" A resposta, mais uma vez, é negativa: "Não. Todos os créditos observados nas contas bancárias analisadas tiveram como origem as pessoas jurídicas declaradas pelo investigado como fonte de sua renda".

O último tópico respondido pela perícia questiona se Demóstenes fez ou concedeu empréstimos. "Nas declarações de imposto de renda apresentadas pelo investigado houve referência acerca de eventual empréstimo contraído ou concedido pelo referido investigado?" A resposta foi positiva. Demóstenes realizou empréstimo para própria filha e doação para uma neta, além do financiamento que realizou junto ao Banco do Brasil para comprar o apartamento em que vive atualmente. Tudo devidamente declarado ao fisco federal.

A perícia constata que o apartamento em que Demóstenes hoje reside, e que foi objeto de questionamento pela imprensa nacional, está financiado e com todas as suas prestações pagas por seus rendimentos como procurador de Justiça ou senador da República, como, aliás, Demóstenes havia afirmado no Conselho de Ética do Senado Federal. Inclusive apresentando os extratos bancários na oportunidade.

A conclusão da perícia realizada pelo Ministério Público de Goiás confirma o que o policial federal Fábio Alvarez já havia dito à Justiça em julho de 2012: "Demóstenes não tinha relações com o jogo". A declaração foi concedida pelo policial durante audiência marcada para ouvir testemunhas e réus da Operação Monte Carlo. Isso referendava o que antes já havia concluído o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e sua esposa, a subprocuradora-geral da República para Assuntos Criminais, Cláudia Sampaio, ou seja, Demóstenes Torres nunca havia participado de qualquer esquema referente a jogos.

Demóstenes foi o boi de piranha de políticos graúdos
A cassação relâmpago do ex-senador Demóstenes Torres, à luz da recente perícia do Ministério Público de Goiás, evidencia que o então parlamentar foi sacrificado para evitar que outros políticos fossem investigados. A perda de mandato de Demóstenes, agora comprovadamente inocente, acalmou a imprensa e jogou no esquecimento acusações contra outros importantes políticos do País.

O vazamento ilegal dos grampos da Operação Monte Carlo colocou muitos políticos em situação delicada. Apesar do método utilizado indicar Demóstenes Torres como alvo, a ação da Polícia Federal colocou políticos de vários partidos na linha de tiro. Apenas entre governadores, cinco nomes foram envolvidos no escândalo: Sérgio Cabral (RJ), Agnelo Queiroz (DF), Siqueira Campos (TO), Silval Barbosa (MT) e Marconi Perillo. Além, é claro, de nomes importantes da política goiana, como o ex-prefeito de Goiânia e agora candidato ao governo Iris Rezende, os deputados federais Leonardo Vilela, Sandes Júnior, Thiago Peixoto e Carlos Alberto Leréia, o prefeito de Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela, o então prefeito de Anápolis e agora também candidato ao governo, Antônio Gomide, e dezenas de deputados estaduais e vereadores.

O PT formaria um capítulo à parte. A presidente Dilma Rousseff, Lula e os mensaleiros, alvos cotidianos dos ataques do ex-senador goiano, chegaram à conclusão de que livrar-se dele seria remover um estorvo à reeleição e, ao mesmo tempo, tentar melar o julgamento do mensalão que se avizinhava. Daí a criação da CPI do Cachoeira, antes refugada pelo próprio governo com receio de que explodir a Delta, uma das empreiteiras que mais receberam recursos do governo federal, com a qual Cachoeira mantinha relações comerciais, poderia respingar em toda administração federal, além de vários governos estaduais alinhados.

O sangramento de tantas autoridades criou uma espécie de acordo entre as lideranças partidárias. Cientes de que Demóstenes Torres, se sacrificado, aplacaria a sede da imprensa, decidiram empurrar o então parlamentar para o cadafalso. A estratégia funcionou. A cassação de Demóstenes esfriou a cobertura do noticiário e a CPI do Cachoeira acabou sem qualquer conclusão importante sobre a relação do contraventor com os demais políticos citados na operação.

Armação política resultou em falsa acusação
A perícia técnica do Ministério Público Estadual revelada pelo Diário da Manhã desmentiu uma das principais acusações contra o ex-senador Demóstenes Torres: a de que o então parlamentar receberia 30% do que era arrecadado com o jogo ilegal em Goiás. A informação publicada pela revista Carta Capital em 2012 na verdade foi um factoide criado por criminosos e políticos goianos para tirar da vida pública o recordista de votos nas eleições de 2010. Jamais apareceu qualquer documento, acusação formal ou processo contra Demóstenes. Tudo foi uma grande farsa.

A reportagem publicada pela revista Carta Capital com o título de "Os 30% de Demóstenes" apontava que desde 2006 a Polícia Federal tinha conhecimento que Demóstenes ficava com 30% da arrecadação do jogo no Estado. As informações, agora comprovadamente mentirosas, foram repassadas em três relatórios assinados pelo delegado Deuselino Valadares dos Santos, então chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (DRCOR), da Superintendência da Polícia Federal em Goiânia. A perícia apresentada pelo Ministério Público encerra de vez a questão ao apontar que Demóstenes não recebeu dinheiro que não fosse fruto do próprio trabalho. O resultado levantou uma nova pergunta: por que, então, surgiu a história dos 30% de Demóstenes?

O DM ouviu fontes dentro da Polícia Federal que apontam novas razões para a denúncia. O nome de Demóstenes foi inserido a pedido do delegado aposentado da Polícia Civil Eurípedes Barsanulfo, que tinha dois motivos para manchar o nome do então senador. Primeiro, Eurípedes queria atingir Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, para assumir o controle do jogo em Goiás. Em segundo lugar, Eurípedes Barsanulfo era assessor de um tradicional político goiano que se considerava ofuscado pelo brilho de Demóstenes no Congresso Nacional. Em apenas um golpe, o delegado se tornaria o chefe do milionário esquema de jogo no Estado e ainda por cima agradaria o seu importante padrinho político, que queria ver Demóstenes fora do processo eleitoral.

A quem interessava a queda de Demóstenes
A comprovação da inocência do ex-senador Demóstenes Torres desnuda uma das principais páginas da história política recente do País. O vazamento ilegal e sistemático de gravações que mais escondiam do que revelavam não era reflexo da relação saudável entre imprensa e órgãos públicos. O objetivo era criar um clima político insustentável para o então senador, fazendo com que fosse ceifado não por eventuais ações que tivesse cometido, mas pelas que o massacre midiático fez parecer que tivesse feito.

A primeira e principal pergunta sobre os vazamentos da operação Monte Carlo nunca foi respondida: quem repassou os áudios para a imprensa? Protegido pelo sigilo entre jornalista e fonte (um preceito criado para salvaguardar quem colabora com a democracia, não para quem tenta tirar vantagem dela), os nomes permanecem em sigilo. Os murmúrios dos bastidores apontam para a Polícia Federal – ou mais precisamente para quem está acima dela. Na falta de uma definição, basta olhar para os interessados apontados nesta reportagem.

Demóstenes era a grande referência da oposição no País. Intelectual de primeira grandeza, era respeitado até mesmo pelos adversários. Não por menos, conseguiu aprovar mais de 90 projetos de leis que continham suas digitais. A legislação completa sobre pedofilia, o Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha, originalmente chamada Lei Consuelo Nasser antes de ser apropriada pelo governo, a consolidação do Bolsa Família, entre muitos outros. O destaque de Demóstenes no Senado Federal o levou a ser reconhecido em todo o País, conquistando a reeleição com recorde histórico de votos em Goiás e surgindo como um dos favoritos para a disputa presidencial em 2014.

Quem seriam então esses interessados? Um dos principais com certeza é o governo federal, especificamente a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula e o chamado grupo dos mensaleiros. A cada discurso na Tribuna, a cada entrevista no Jornal Nacional, a cada artigo na Folha de S.Paulo, Demóstenes elevava o nível do debate nacional ao das grandes democracias. Algo que um governo acostumado a dominar o Congresso por meio do mensalão não está habituado. E se existe algo que o PT sabe fazer bem é aparelhar instituições para tirar proveito político e atacar adversários, vide o papel da Receita Federal nas últimas eleições em relação à família Serra. Vazar gravações da Polícia Federal é brincadeira de criança. Apesar de todos os indícios apontarem para uma articulação do governo, a própria oposição também tinha seus ressentimentos contra o ex-senador. Nomes que antes brilhavam nas capas de jornais passaram a frequentar os cantos de página.

O grupo dos "éticos" perdeu espaço para Demóstenes, que, além de uma grande oratória, ainda possui um conhecimento jurídico ímpar. E na política, para muitos, o destaque na imprensa e o reconhecimento popular é a base da carreira. Vê-lo fora do cenário era para alguns até mesmo a reafirmação do próprio ego.

No final das contas, apenas a população tinha motivos para comemorar a presença de Demóstenes no Congresso Nacional. Um parlamentar que não era pautado pelos acordos partidários, que tinha consciência sobre o seu papel na política. A saída de Demóstenes Torres do Senado significou o empobrecimento da própria democracia brasileira.

Fonte: Diário da Manhã

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